Carta ao Que Não Vê

Essa carta busca expressar os sentimentos de alguém que sofre com a falta de reconhecimento e a desvalorização, sem mencionar diretamente o transtorno, mas deixando implícito o comportamento narcisista.

  • Compartilhe!
  • Compartilhar no Facebook
  • Compartilhar no Twitter
Carta ao Que Não Vê

Querido,

Há muito tempo venho tentando encontrar as palavras certas. Não para explicar, mas para compartilhar algo que talvez nunca tenha tido a chance de ser ouvido. Há momentos em que me sinto invisível. Eu estou aqui, ao seu lado, mas parece que o que sou, o que sinto, se dissolve no silêncio de quem observa à distância.

Quero que saiba que já houve dias em que me senti iluminada pela sua presença.  Como se o brilho que você carrega fosse suficiente para ambos. Era reconfortante, e, de certa forma, eu me sentia envolvida por isso. Mas, com o tempo, esse brilho que tanto admirava passou a me ofuscar, a ponto de eu quase não conseguir enxergar quem sou ao seu lado. Fui me apagando, pouco a pouco.

Nem sei se você percebe o peso que suas palavras e gestos carregam. Às vezes, uma simples frase, dita com desdém ou indiferença, pode atingir com a força de um golpe. E não é tanto pela dureza da palavra em si, mas pela sensação de que o que sou, o que sinto, parece não ter relevância. Já me perguntei tantas vezes: será que você me vê? Ou sou apenas o reflexo do que você espera que eu seja?

Já tentei te agradar, encontrar uma maneira de não te incomodar, de estar sempre a altura do que você parece desejar. Mas, por mais que me esforce, sempre há algo errado. É como se minha essência nunca fosse suficiente. E isso dói. Dói porque me faz duvidar de mim mesma, de meu valor, de minha própria existência.

Sei que, de alguma forma, você também carrega suas dores. Posso até imaginar que, lá no fundo, essa necessidade de reconhecimento e aprovação venha de uma ferida que talvez nunca tenha cicatrizado. E, por muito tempo, acreditei que, se eu fosse suficientemente boa, poderia ajudar a curá-la. Mas aprendi que não sou capaz disso. O que posso oferecer é minha presença, minha verdade, mas nunca será o bastante para preencher o vazio que você sente.

Por vezes, esse vazio também me engole. A sensação de dar sem receber, de me entregar sem ser reconhecida, me esgota. Fico à deriva, tentando entender onde me perdi nessa tentativa de te alcançar. Será que algum dia terei espaço para ser vista em minha totalidade? Será que poderei existir ao seu lado sem me diminuir?

Não escrevo estas palavras para cobrar, julgar ou pedir algo que talvez você jamais possa dar. Escrevo porque preciso que você saiba o impacto que isso tem sobre mim. Escrevo porque estou aqui tentando sobreviver em um espaço onde, muitas vezes, não há lugar para mim.

Ainda há em mim um desejo de que, em algum momento, você possa enxergar além do seu próprio reflexo. Que perceba que há uma vida, um ser, esperando pacientemente por ser visto e reconhecido, não por aquilo que faz por você, mas por aquilo que é.

Com sentimentos guardados e esperanças tênues,

Eu.


COMPANHIA NO DIVÃ - Bia Melara

 

Que sensações teve com o artigo?

Selecione as emoções que experimentou com este artigo


Reações dos demais leitores:

{}1

Conte-nos mais! Comente no final desta página.

  • Compartilhe!
  • Compartilhar no Facebook
  • Compartilhar no Twitter

Olá, deixe seu comentário para Carta ao Que Não Vê

Enviando Comentário Fechar :/